Tradição centenária do Jogo do Quartão volta a animar as ruas da Chamusca (C/FOTOS)

14 Fevereiro 2024, 17:43 Não Por André Azevedo

“Tens razão… pagas!” é a frase que se ouve, em coro, logo a seguir ao baque do quartão de barro ao despedaçar-se no chão. Significa isto que o jogador tem que pagar uma rodada na próxima taberna onde parar o grupo do “Jogo do Quartão”, uma tradição já centenária na vila da Chamusca e que encerra as celebrações do Carnaval.

O “Jogo do Quartão” realiza-se na Quarta-Feira de Cinzas, e as regras são simples: Os homens da vila vão percorrendo as ruas enquanto atiram entre si um quartão de barro, como se de uma bola se tratasse. Quem deixar cair paga uma rodada na próxima taberna onde o grupo parar. Tudo isto acompanhado de copos de vinho, que embora não sendo obrigação, acaba por fazer parte do jogo e do convívio, e que acaba por mostrar a perícia dos jogadores, que se forem apanhados desprevenidos têm que se desembaraçar do copo, de preferência sem entornar. O jogo termina quando se tiver percorrido todos os estabelecimentos.

Este ano não foi excepção e cerca de 60 jogadores saíram à rua para cumprir a tradição na quarta-feira, 14 de Fevereiro. O dia começa com a preparação do Almoço do Grelo, tradicionalmente no Grupo Dramático Musical JNP, onde os participantes, maioritariamente homens, se repastam com uma refeição de bacalhau com grelos regada com bom vinho. De lá partem para o largo da Igreja da Misericórdia, onde se forma uma roda e se faz um minuto de silêncio em memória dos jogadores que já partiram.

O primeiro quartão é atirado ao ar e, invariavelmente, cai no chão e parte-se em honra dos finados. Começa então, em passo lento, que a tarde adivinha-se longa, o jogo.

Na principal via da Chamusca o trânsito vai parando. Quer para observar os jogadores a atirarem (ainda) habilmente o quartão entre si, quer porque os jogadores não deixam o trânsito circular, algo já habitual neste dia, quase como um ritual para dar a conhecer o jogo a quem passa. Alguns mais intrépidos abordam alguns condutores para pedir um contributo, que servirá para comprar os quartões do próximo ano, já que como os tempos são outros, não se roubam quartões velhos das portas das casas ou das fontes, como acontecia nos primórdios do jogo.

A rodada também já não é paga por quem parte o quartão como antigamente. Hoje em dia são os próprios comerciantes que entram no jogo e que acabam por oferecer petiscos e bebidas aos participantes. Ainda assim, quem parte, deixa o “valor simbólico do quartão” para comprar os do próximo ano, explica Vitor Rosa, um dos mais antigos participantes do jogo.

“É uma tradição única no mundo e um motivo de orgulho para qualquer chamusquense ver tantas pessoas aqui reunidas”, afirma Vitor Rosa, que quando é chamado a jogo é apelidado de Vitinho, pelos outros participantes.

Não só de homens adultos se faz o “Jogo do Quartão”. Várias crianças marcaram presença no largo da igreja, onde começou o jogo e que por lá ficaram a jogar uma versão adaptada do jogo, com quartões mais pequenos e apenas numa roda. Ainda assim, alguns adolescentes já acompanham o grupo, percorrendo as ruas, atirando quartões.

“Antigamente era um grupo mais fechado, mas hoje em dia incluímos os mais jovens”, explica ao NS Vitor Rosa, acrescentando que é uma forma de garantir a continuidade desta tradição tão singular. Os mais velhos, mais experientes, apenas deixam cair o quartão quando entendem que é hora de passar ao próximo, mas, mais frequentemente acabam por fazer um lançamento mais complicado para que os mais jovens e menos experientes acabem por deixar cair, ou mesmo para os donos dos estabelecimentos deixarem cair o quartão e pagarem a rodada.

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