Sentença do processo ‘cartel da banca’ é conhecida hoje

20 Setembro 2024, 9:50 Não Por André Azevedo

A sentença dos bancos que recorreram das multas de 225 milhões de euros aplicadas pela Autoridade da Concorrência é hoje conhecida, depois de há dois anos a juíza ter dado como provados factos do processo conhecido por ‘cartel da banca’.

Desde 2021, decorre no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém, o julgamento de recurso de 11 dos bancos multados em 2019 pela Autoridade da Concorrência (AdC) pela prática concertada de troca de informação no crédito.

Segundo o regulador, entre 2002 e 2013, 14 bancos partilharam informação entre si, nomeadamente tabelas das taxas ‘spreads’ (margem de lucro comercial) a aplicar aos créditos (habitação, consumo e a empresas) e os volumes de produção, tendo-os multado no total em 225 milhões de euros.

Já em abril de 2022, a juíza Mariana Gomes Machado deu factos como provados (que os bancos trocaram informação sobre preços/taxas (atuais e futuras) que não eram do domínio público ou que eram de difícil acesso, que partilhavam valores mensais de produção de crédito e que estas trocas de informação permitiram uma coordenação informal) mas, ao mesmo tempo, decidiu suspender a instância e remeter ao Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) para esclarecimentos.

A juíza pediu que o tribunal europeu se pronunciasse sobre se os factos constituíam restrição de concorrência por objeto (por não ter ficado provado se a troca de informação teve ou não efeito sobre os consumidores), tendo demorado mais de dois anos a resposta, que chegou em julho último.

Na sua decisão, o TJUE admite que a troca de informações mantida pelos bancos durante mais de uma década “pode constituir uma restrição à concorrência por objeto” e que “basta que essa troca constitua uma forma de coordenação que, pela sua própria natureza, seja necessariamente […] prejudicial ao correto e normal funcionamento da concorrência”.

Cabe agora ao Tribunal da Concorrência decidir se os factos são ou não uma “restrição por objeto” – geralmente os tribunais nacionais seguem o entendimento do tribunal europeu – e as coimas a aplicar aos factos provados (se se mantêm ou se são revistos os valores da AdC).

Na quarta-feira, decorreram as alegações sobre o acórdão europeu, em que ficaram expostas as diferentes interpretações da Autoridade da Concorrência e do Ministério Público, por um lado, e dos bancos, por outro lado.

O regulador considerou que a decisão da Justiça europeia foi “cristalina, assertiva”, pelo que o tribunal nacional “está em condições de confirmar na íntegra” as multas.

Para o Ministério Público, este processo demonstrou que a partilha de informação teve efeitos no mercado “com clientes prejudicados”, a pagarem preços no crédito mais elevados, e que, ao mesmo tempo, permitiu aos bancos “dar créditos com maior segurança” por conhecerem a posição dos concorrentes.

O procurador aludiu aos “ótimos resultados” dos bancos, desde logo em 2023, para defender que na generalidade as multas da AdC são adequadas e devem ser confirmadas pelo tribunal.

Já os bancos negaram que tenham partilhado informações estratégicas e violado a normal concorrência e pediram a absolvição ou coimas simbólicas. Sobre o acórdão europeu, consideraram que traz até elementos abonatórios para a sua causa ao defender uma análise diferenciada das infrações em análise.

Após a sentença de hoje é expectável que o processo continue seguindo para recurso (Tribunal da Relação e eventualmente Supremo Tribunal e Tribunal Constitucional).

Além de continuarem a contestar as infrações, os bancos deverão também advogar com prescrições (já na quarta-feira apresentaram requerimentos para admissão de pareceres sobre prescrições), defendendo que a paragem do processo faz cair coimas.

Este processo teve origem numa denúncia do britânico Barclays, em 2013, que pediu clemência. Após a investigação, em 2019, a AdC condenou a Caixa Geral de Depósitos (CGD) ao pagamento de 82 milhões de euros, o Banco Comercial Português (BCP) de 60 milhões, o Santander Totta de 35,65 milhões, o BPI em 30 milhões, o Montepio em 13 milhões (coima reduzida em metade por ter aderido ao pedido de clemência), o BBVA em 2,5 milhões, o BES em 700.000 euros, o Banco BIC (por factos praticados pelo BPN) em 500.000 euros, o Deutsche Bank (cuja infração prescreveu em outubro de 2020) e a Caixa Central de Crédito Agrícola em 350.000 euros cada um. Já à Union de Créditos Inmobiliarios coube um pagamento de 150.000 e ao Banif (que não recorreu) de mil euros.

O Abanca, também visado no processo, viu a infração prescrever ainda na fase administrativa e o Barclays, que apresentou o pedido de clemência, viu suspensa a coima de oito milhões de euros.

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