Opinião – DA TERRA À MESA, ENTRE A CHARNECA E A LEZÍRIA

28 Fevereiro 2023, 15:33 Não Por Redacção

Sou de opinião que a identidade forte de uma região como a nossa se compreende à mesa, com amigos e familiares, quando se sente o aroma, a cor e o paladar da gastronomia local, repleta de sabor e de história; explicada pela geografia física, determinação humana e os ciclos das estações do ano, reportados ao período anterior à globalização.

Certo é que a gastronomia é o produto cultural e turístico de experiência individual que fixa, como poucos, a ligação ao território e é por isto que se desdobram os certames gastronómicos, parcerias entre municípios, restauração e produtores e as provas estão sempre presentes, em feiras generalistas ou de especialidade.

Entre a charneca do montado, a lezíria fértil, o rio Tejo e o seu afluente Sorraia, é natural que os comeres de outros tempos sejam marcados pela influência dos ciclos do trabalho agrícola, os movimentos migratórios e a atividade piscatória de rio. Li uma vez que a Lezíria é o território dos quatro efes – fundos, fortes, frescos e férteis.

Desde logo, fazemos parte da cultura mediterrânica: sol, água, planície e clima ameno fazem com que, na base da alimentação tradicional estejam quatro elementos:  o pão, o azeite, o alho e o vinho. O resto juntava-se na panela, conforme o ciclo da estação, as reservas e o que a terra ou o rio davam…

A proximidade ao Alentejo explica o gosto por juntar aos caldos, a magia das aromáticas que davam um disfarçado sabor à escassez. E assim se foram enriquecendo sopas, condutos, juntando aos cereais, as carnes, o bacalhau, o peixe de rio, a batata, o arroz, os legumes e as leguminosas, pratos de substância, sempre acompanhados por vinhos, ora encorpados, ora suaves.

Do engenho humano, criaram-se os antepastos, como os espargos selvagens, as túberas, os cogumelos, as azeitonas temperadas e os “pratinhos” das partes menos nobres dos animais. E das épocas festivas, as sobremesas têm o mel, o açúcar amarelo, o pinhão, o azeite, os citrinos, as massas fintas, como base da arte.

O ciclo de final do inverno corresponde ao período de desmatação, podas de formação e de preparo das terras para os ciclos de produção de primavera e verão, o que explica a necessidade de alimento de conforto.

Entendendo que um território é uma cultura viva, tanto mais quanto se souber valorizar e preservar o património gastronómico, assim será a sua importância para a economia local.

Uma palavra de incentivo à cozinha de inovação que é a evolução natural da gastronomia. Também aqui a nossa região dá provas de excelência através das escolas profissionais que formam e elevam a região para a melhor restauração nacional e internacional. E uma palavra de reconhecimento à gastronomia de autor, dos jovens chefs ribatejanos que têm sabido interpretar, acrescentar valor e novos roteiros gastronómicos na Lezíria.

Por fim, este artigo é um convite à reflexão sobre quem fomos e quem somos coletivamente. O ritmo acelerado e os hábitos dos nossos dias, afastam-nos da boa mesa, característica dos portugueses. E quem não sente, de quando em vez, saudades daquela receita especial da infância, com aquele ingrediente secreto, os afetos?

Ficam os desafios gastronómicos do mês de março:

Mora – Mês das Migas, entre 3 de fevereiro e 5 de março, a acontecer na restauração aderente;

Coruche – Jornadas da Gastronomia, de 3 a 5 de março, na sua trigésima terceira edição, na restauração aderente. Evento de evocação de José Labaredas, um reconhecido gastrófilo local que escreveu a monografia “Coruche à Mesa”. 

Salvaterra de Magos – “Mês da Enguia”, rainha do Tejo.  De 1 de março a 2 de abril, na sua vigésima sétima edição, na restauração aderente. Junta-se uma feira nacional de artesanato e produtos tradicionais.

Benavente – Festival do arroz carolino, dentro de portas. Projeto de valorização do arroz carolino da lezíria ribatejana. A acontecer na restauração aderente, uma vez por mês até ao evento principal que terá lugar em maio.

E fica garantida a boa mesa, a animação musical, o resto… a boa disposição, é consigo, caro leitor!

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